Nesta 2ª Parte do texto sobre os arquivos militares procuro dar alguma
informação sobre os seus fundos principais,
assim como sobre a documentação relacionada com a Guerra Colonial que pode ser
consultada. Espero que seja útil ainda hoje.
Entrada no Arquivo Histórico Militar, Pátio dos Canhões do edifício do Estado Maior do Exército, junto a Santa Apolónia. |
Parte
2
Feita
esta longa introdução, gostaria de vos falar sobre os arquivos militares, tema
da minha intervenção.
Existem
em Portugal quatro Arquivos Históricos no âmbito da Defesa e Forças Armadas. Um
do próprio Ministério e um para cada Ramo das Forças Armadas – Marinha,
Exército e Força Aérea.
Marinha
– Arquivo Histórico da Marinha - AHMarinha
Exército
– Arquivo Histórico Militar - AHM
Força
Aérea – Arquivo Histórico da Força Aérea - AHFA
Ministério
– Arquivo da Defesa Nacional - ADN
Até
ao Século XIX, na estrutura da Estado Português, os assuntos da Guerra e dos
Negócios Estrangeiros estiveram juntos na Secretaria de Estado dos Negócios
Estrangeiros e da Guerra. Esta circunstância reflectiu-se na separação da
documentação entre as entidades (AHM, AHD e Arquivo Nacional), quando estas se
separaram, depois da revolução liberal de 1820. Se tivermos em conta que o
Arquivo Histórico Diplomático só foi criado na segunda metade do Século XIX,
pode imaginar-se como são importantes os guias de fontes para hoje podermos
saber onde estão os fundos documentais da Administração Portuguesa.
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Sala de leitura do Arquivo Histórico da Marinha, situado no edifício da Cordoaria, Rua da Junqueira. |
Mas
também os assuntos da Marinha e das Colónias estiveram juntos na Secretaria de
Estado dos Negócios da Marinha e Colónias. Os documentos foram depois
distribuídos entre o Arquivo Histórico da Marinha e o Arquivo Colonial (hoje
Arquivo Histórico Ultramarino), sem esquecer que muita da documentação da
estrutura administrativa do Estado foi absorvida pelo Arquivo Nacional.
O
Ministério da Defesa só foi criado em 1950, apenas como órgão de planeamento.
Só em 1974 assumiu em pleno a sua função política. A Força Aérea foi criada em
1952 como Ramo autónomo, herdando as tradições da Aeronáutica Militar, mas não
recebendo a sua documentação que ficou no Exército.
Em
resumo, as datas de criação dos Arquivos deixam-nos perceber as dificuldades
arquivísticas de uma visão de conjunto:
Arquivo
da Marinha – 1843 (como arquivo administrativo);
Arquivo
Militar – 1802 (apenas para os mapas, as cartas topográficas e as plantas de
engenharia);
Arquivo
Histórico da Força Aérea – 1952;
Arquivo
da Defesa Nacional – 1996.
Ainda
hoje, apesar do esforço feito na normalização da actividade dos arquivos, não
existe um guia cruzado que oriente o investigador neste emaranhado de heranças.
A
missão destes Arquivos é comum, visando essencialmente a recolha, preservação,
tratamento e divulgação da documentação histórica de cada sector, de acordo com
as normas em vigor.
A
gestão dos Arquivos militares tem muita autonomia, não existindo qualquer órgão
de coordenação comum. Todos se orientam pelas normas nacionais e internacionais
em vigor, procurando seguir as orientações do Arquivo Nacional.
O
Arquivo Histórico da Marinha está instalado no edifício da antiga Fábrica de
Cordoaria, em Lisboa. Em
conjunto com o respectivo arquivo intermédio, ocupam 2.000 m2 de superfície e
possuem 7.000 metros
de prateleira. Tem alguns documentos dos séculos XVII e XVIII, mas a sua
documentação respeita essencialmente aos séculos XIX e XX.
Os
seus fundos mais importantes são: Diários de bordo, planos e projectos de
construção naval, cartografia naval e Guerra Colonial.
O
Arquivo Histórico Militar está instalado no edifício do Estado-Maior do
Exército, em Lisboa (Antigo Arsenal do Exército), e na antiga Fábrica de
Pólvoras de Chelas. Ocupa uma área de 2.000 m2 e tem 8.000 metros de
prateleira. Tem alguns documentos desde o Século XVI, mas a sua documentação é
significativa desde meados do século XVIII até à actualidade. Existem planos
para uma transferência de instalações.
O
arquivo intermédio do Exército está instalado no Convento de Chelas em Lisboa,
e possui 21.000 metros
de documentação. Toda a população masculina portuguesa tem registos desde
meados do Século XIX.
Fundos
históricos mais importantes: Guerra Peninsular (1807-1814), Lutas Liberais
(1820-1851), Grande Guerra (1914-1918), Guerra Colonial (1961-1975).
O
Arquivo Histórico da Força Aérea está instalado no edifício do Estado-Maior da
Força Aérea em Alfragide, próximo de Lisboa. Ocupa 300 m2 e tem 1500 metros de
prateleira. Tem documentação do Século XX.
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Aspeto do Arquivo Histórico da Força Aérea, situado no edifício do Estado Maior da Força Aérea, em Alfragide. |
Fundos
mais importantes: Unidades da Força Aérea, Guerra Colonial, Colecção
fotográfica, incluindo fotografias aéreas de Portugal.
O
Arquivo da Defesa Nacional está instalado numa unidade militar (Centro Militar
de Electrónica) em Paço d’Arcos, próximo de Lisboa. Ocupa uma área de 700 m2 e tem 4.000 metros de
estante ocupada. A sua documentação é da segunda metade do Século XX.
Fundos
mais importantes: NATO (1949-1975), Guerra Colonial (1961-1975) e Fundos do
Ministério da Defesa (1950-1975).
Todos
os Arquivos têm um regulamento devidamente aprovado, que fixa as normas de
avaliação, selecção e eliminação de documentos. Estes regulamentos parciais
devem ser aprovados pela Direcção Geral de Arquivos (órgão governamental).
Todos
os Arquivos estão abertos à leitura, com acesso diário, em sala apropriada. As
normas são bastante semelhantes. Na Força Aérea é necessário um contacto
prévio.
Os
Arquivos procedem à desclassificação de fundos e documentos, de acordo com as
normas gerais da administração pública portuguesa, embora com pouca eficiência;
todos têm formas de divulgação das suas actividades, pelo menos através da
Internet; de uma forma geral procedem a algumas investigações simples a pedido
dos leitores.
Todos
os Arquivos têm falta de pessoal especializado. As massas documentais são muito
grandes e só muito recentemente a avaliação está a ser feita na origem. As
normas de abertura da documentação e de acesso são muito genéricas, havendo
nesse campo dúvidas comuns. As classificações de segurança, muito comuns na
documentação militar, dificultam a abertura dos fundos, não havendo ainda uma
norma de desclassificação simples e efectiva, ao nível dos arquivos históricos.
Todos
os Arquivos têm divulgação através da Internet, com página especial, como
segue:
Marinha
– https://arquivohistorico.marinha.pt/
Exército
– https://arqhist.exercito.pt/
Força
Aérea – http://www.emfa.pt/www/po/ahfa/
Ministério
da Defesa – http://www.portugal.gov.pt/pt/ministerios/mdn/quero-saber-mais/quero-aprender/arquivo-da-defesa-nacional.aspx
Nos
últimos vinte anos, os Arquivos Militares Portugueses fizeram um grande esforço
para cumprirem as suas missões e para se modernizarem. Mas têm ainda um longo
caminho a percorrer.
Agora,
uma palavra sobre a Guerra Colonial, na sua relação com estes Arquivos.
Como
verificaram, a Guerra Colonial é em todos os arquivos militares, um dos fundos
mais importantes. Mas até 1997, o acesso a estes fundos era muito limitado.
Ainda hoje existem algumas limitações, não contempladas pela lei geral do
acesso aos documentos da administração pública.
Limito-me
aqui a falar do Arquivo Histórico Militar e do Arquivo da Defesa Nacional, que
conheço melhor. Ambos têm diversos fundos sobre a Guerra Colonial, todos
acessíveis.
Cartaz utilizado na Ação Psicológica na Guerra Colonial, existente no Arquivo Histórico Militar. |
No
AHM são essenciais os fundos respeitantes aos três territórios onde a guerra
colonial teve lugar – Angola, Guiné e Moçambique. Estes fundos foram separados
como colecções de documentos, sem qualquer preocupação organizativa. É
necessária alguma paciência para encontrar o que procuramos. Nenhum tem
inventário, sendo o acesso feito através de ficheiros manuais.
Foram
recentemente abertos dois fundos [em 2006] (Repartição de Gabinete do Ministro
da Guerra/Ministro do Exército e Repartição de Gabinete do Chefe de Estado-Maior
do Exército) essenciais para o conhecimento e a investigação deste período.
Estão organizados segundo as normas e têm inventário, o que facilita
enormemente a pesquisa.
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Edifício onde está instalado o Arquivo da Defesa Nacional, no Centro Militar de Electrónica, em Paço de Arcos, à espera de ter casa própria. |
No
que respeita ao ADN, a sua importância para o período da Guerra Colonial é
muito grande. Toda a documentação do período da guerra está acessível, embora
apenas uma parte possua inventário. A grande massa documental respeita ao
Secretariado Geral da Defesa Nacional, cujo acesso é feito através de um
registo digital com descrições bastantes pobres. Mas o fundo do Gabinete do
Ministro está já definitivamente organizado e possui inventário.
O
que essencialmente está a faltar é o trabalho de investigação. Os instrumentos
colocados à disposição dos investigadores são bastantes razoáveis. O que todos
esperamos é que o assunto mereça cada vez mais interesse da Universidade e do
público em geral. O que mais satisfaz os responsáveis por estas instituições é
que as suas salas de leitura estejam cheias.
A
forma como em Portugal se relembraram (e continuam a relembrar) os 50 anos do
início da Guerra Colonial faz-nos crer que o interesse por este período recente
e marcante da vida nacional venha a reflectir-se na frequência dos Arquivos
militares.
Caro Coronel Aniceto Afonso, este seu resumo é muito útil para uma 'amadora de história' como eu... No entanto, não resisto acrescentar um pormenor, q é o quanto horário do AHM dificulta enormemente qq consulta... 1 hora e 1/2 para almoço?! abertura às 10 e encerramento às 16:45?! reclamei por escrito, mas nunca me responderam sequer ... um beijinho Fernanda Paraiso
ResponderEliminarCara Amiga, Tem toda a razão, era tempo de o Exército resolver este problema, no interesse dos leitores e no seu próprio interesse. Espero bem que o faça. Abraço amigo.
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